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13/12/2025
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Reinventar o tempo de trabalho: a mensagem de Nicholas Barr que desafia o século XXI

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Há ideias que não apenas interpretam a realidade: mudam-na.

 

Entre os grandes debates abertos pela longevidade — a saúde, os cuidados, as pensões, a educação —, um destaca-se pela sua urgência e pelo seu alcance civilizacional: como reimaginar o tempo de trabalho em sociedades que vivem mais do que nunca.

 

O economista Nicholas Barr, professor da London School of Economics, dedicou grande parte da sua carreira a responder a essa pergunta. A sua análise recente, publicada em 2025 e difundida pelo CENIE, foi um dos textos mais citados e debatidos do ano. Não apenas pela precisão económica, mas porque traduz em palavras o que define esta nova era da longevidade: a necessidade de um contrato social que distribua o tempo de outra forma.

 

Uma sociedade que já não cabe nos velhos relógios
 

Barr parte de uma evidência incontestável: nos países desenvolvidos, uma pessoa de 20 anos tem hoje mais de 50% de probabilidades de viver até aos 100.

 

Mas os sistemas de bem-estar e de emprego continuam ancorados no século passado, com idades de reforma fixas e carreiras laborais desenhadas para vidas muito mais curtas. “Se vivemos mais mas trabalhamos o mesmo — afirma Barr —, os equilíbrios quebram-se.”

 

O desafio não é apenas financeiro — como pagar pensões mais longas —; é cultural, ético e produtivo. A proposta é simples e radical: o tempo deve ser repartido de outra maneira.

 

Mais aprendizagem ao longo da vida, mais flexibilidade para trabalhar e descansar, mais oportunidades de recomeçar.

 

A reforma: de ponto final a transição vital
 

A reforma, lembra Barr, foi uma invenção do século XIX: um mecanismo para retirar do trabalho quem, aos 65 anos, já estava doente ou exausto.

 

Hoje, a idade perdeu esse significado. Uma mulher ou um homem de 70 podem continuar ativos, ensinar, criar, aportar valor.

 

Por isso, Barr defende substituir a ideia de reforma como fim pela de transição vital: um passo flexível, gradual, até reversível.

 

Países como a Suécia e a Noruega já aplicam este modelo: permitem receber parte da pensão enquanto se continua a trabalhar. Não é uma concessão económica, mas uma conquista de liberdade.

 

O valor da experiência
 

Barr desmonta um dos preconceitos mais enraizados: a ideia de que o envelhecimento retira valor ao trabalho.

 

Para o economista, os trabalhadores mais velhos são necessários e valiosos. A sua contribuição mede-se não apenas em produtividade, mas em inteligência emocional, liderança colaborativa e capacidade de ligar gerações.

 

Enquanto a inteligência artificial substitui tarefas mecânicas, os mais velhos oferecem o que nenhuma máquina reproduz: empatia, intuição, memória das mudanças.

 

“A longevidade — diz Barr — não é um problema a financiar, mas um talento a integrar.”

 

Flexibilidade, equidade, propósito
 

O seu discurso não se limita a propor reformas mais tardias. É um convite a mudar de paradigma: substituir rigidez por escolha, construir sistemas que não punam quem quer continuar a contribuir, nem esqueçam quem não pode fazê-lo.

 

As suas propostas — aumento gradual e justo da idade da pensão, pensões parciais, acesso antecipado para quem começou mais cedo ou sofre de doenças crónicas, formação contínua, adaptação do ambiente laboral — desenham uma rota para governos e empresas.

 

Mas a mensagem mais profunda é política e humana: trabalhar mais tempo não deve ser visto como obrigação, mas como oportunidade de escolher com sentido como viver a segunda metade da vida.

 

Por que importa ao CENIE
 

O CENIE destaca este ensaio porque traduz a sua visão: a longevidade como transformação estrutural das sociedades, não como fenómeno demográfico a gerir defensivamente.

 

Falar de trabalho na era da longevidade é falar de redistribuir a vida. De combinar progresso, justiça e bem-estar num tempo que, pela primeira vez, nos sobra.

 

O legado de Barr
 

Num século em que a esperança de vida continuará a crescer, a sua mensagem é técnica e inspiradora: “O tempo de trabalho também é tempo de vida. E se aprendermos a geri-lo com justiça, a longevidade deixará de ser um desafio para se tornar numa oportunidade partilhada.”

 

Por isso, este texto ocupa um lugar central entre os Destacados do Ano do CENIE: porque sintetiza, com rigor e visão, uma ideia que marcará o futuro imediato das nossas políticas, empresas e biografias.

 

A longevidade exige repensar horários, trajetórias e finais. E o pensamento de Nicholas Barr lembra-nos que fazê-lo não é uma ameaça, mas uma promessa: a de construir sociedades capazes de transformar o tempo em bem-estar.