12/04/2025

Navegar na longevidade: uma nova cultura para um novo tempo

Navegar la longevidad: una nueva cultura para un nuevo tiempo

Estamos a viver uma mudança de época que não se mede em ciclos políticos ou invenções tecnológicas, mas em anos vividos. Ganhámos décadas de vida, mas ainda não aprendemos totalmente a vivê-las. Este é talvez o grande paradoxo do nosso tempo: temos uma das maiores conquistas da história - a longevidade - e, no entanto, continuamos a tratá-la como um problema e não como uma oportunidade. 

No CENIE acreditamos que chegou o momento de mudar de rumo. É por isso que abrimos este blogue: para partilhar reflexões, alertas e certezas sobre o novo território vital em que já estamos todos a viver. Porque não se trata apenas de viver mais, mas de viver melhor. E para isso precisamos de construir uma nova cultura da longevidade

Uma cultura que não nos condene à obsolescência 

Durante demasiado tempo, a velhice foi vista como um território de declínio, um capítulo de despedida ou um fardo social. Esta visão, profundamente enraizada em estereótipos, moldou as políticas públicas, as estruturas de emprego, os modelos de saúde e até as nossas formas de nos relacionarmos uns com os outros. Mas já não corresponde à realidade. 

Atualmente, milhões de pessoas com mais de 60 anos - e 70, e 80 - continuam a oferecer talento, experiência, criatividade e significado. São protagonistas, não espetadores. E, no entanto, vivem numa cultura que ainda as coloca à margem da narrativa do progresso. Isto tem um custo enorme: não só humano, mas também económico, social e democrático. 

Precisamos de uma narrativa diferente, que não meça o valor de uma vida pela sua idade cronológica, mas pela sua capacidade de continuar a participar, a decidir, a construir. Uma cultura que não condene ninguém à invisibilidade por estar a envelhecer. 

Da urgência à estratégia 

Estamos a envelhecer enquanto sociedade. E estamos a envelhecer rapidamente. Este fenómeno, embora previsível, apanhou desprevenidas muitas agendas públicas. A resposta é frequentemente baseada na urgência: mais recursos sociais e de saúde, mais lares, mais planos de dependência. Mas se ficarmos por aqui, continuaremos à mercê do problema. 

A longevidade exige uma estratégia. E isso significa antecipação, investimento na prevenção, políticas intergeracionais, novos pactos laborais, reformas urbanas, transformação dos sistemas educativo, digital e de saúde. A longevidade não é uma questão de “mais tarde”, é uma questão de presente que condiciona o futuro

E, como qualquer mudança profunda, precisa de tempo, coragem e visão. No CENIE, trabalhamos precisamente para isso: para promover uma abordagem científica, ética e transformadora do envelhecimento e da longevidade, com uma vocação internacional e um compromisso com os territórios. 

Uma nova cartografia vital 

A longevidade não só prolonga a vida, como também muda a sua forma. As etapas tradicionais (infância, juventude, maturidade, velhice) já não descrevem adequadamente a complexidade das nossas trajetórias de vida. A educação alarga-se, o trabalho reinventa-se, as famílias mudam, os cuidados diversificam-se. E tudo isto acontece num contexto de transformações tecnológicas, climáticas e culturais que põem em causa as nossas certezas. 

O que significa ter hoje 70 anos? e 90? durante quanto tempo trabalharemos? quem cuidará de quem? como assegurar que a qualidade de vida seja acompanhada pela quantidade? Estas não são perguntas retóricas: são as grandes questões das sociedades longevas. Responder a elas não é tarefa de uma única disciplina ou de um único sector. Requer parcerias, inovação e uma escuta ativa das pessoas idosas, que continuam a ser frequentemente as mais negligenciadas na conceção social. 

É por isso que no CENIE promovemos uma abordagem plural e integradora, em que a longevidade não está confinada às margens da política social, mas atravessa as políticas económicas, urbanas, educativas, tecnológicas e culturais. Porque a longevidade não é um nicho: é o novo quadro estrutural do século XXI. 

Uma viagem partilhada 

O Diário de Bordo do CENIE nasce com a vocação de uma crónica e de uma bússola. Não temos a pretensão de ter todas as respostas, mas queremos partilhar algumas perguntas bem formuladas. Todas as semanas abriremos aqui uma janela: para uma ideia, para uma informação reveladora, para uma experiência transformadora. Por vezes provocaremos, outras vezes convidaremos a olhar mais além, sempre com o objetivo de construir um pensamento em torno desta grande transição. 

Não se trata de romantizar o envelhecimento. Trata-se de o compreender em toda a sua complexidade e de agir com inteligência colectiva. Porque nem todos envelhecemos da mesma forma, nem ao mesmo ritmo, nem com as mesmas oportunidades. Mas todos somos chamados a participar nesta mudança de época.

A longevidade não é um destino individual, mas uma viagem partilhada. E como dizia o poeta León Felipe: o importante não é chegar sozinho ou cedo, mas chegar com todos e a tempo. Bem-vindos a bordo.