A reforma não é um adeus: trabalho, aprendizagem e propósito na longevidade

Reformar-se não deveria ser desconectar-se, e sim reconectar-se com o que dá sentido. Na longevidade, o propósito também se alonga.
Para além do ponto final
Durante décadas, a reforma foi entendida como um ponto final: o momento em que se deixa o mundo do trabalho para descansar, depois de toda uma vida de esforço. Mas numa sociedade em que vivemos cada vez mais — e onde muitas pessoas chegam aos 65 anos com saúde, vontade e experiência — essa imagem da aposentadoria como “saída definitiva” começa a ficar obsoleta.
Hoje, a reforma não se impõe como rotura, mas pode ser redesenhada como transição. Uma pausa, um reajuste, um novo começo. Para muitas pessoas idosas, deixar o emprego não significa abandonar a atividade, mas reconfigurar o sentido do tempo, do trabalho e do compromisso com o entorno.
Permanecer ativo: uma opção… e um direito
Um estudo na Dinamarca mostrou que as pessoas que continuam ativas no trabalho além da idade oficial da reforma tendem a ter mais saúde, maior estabilidade económica e, em muitos casos, continuam motivadas por um desejo genuíno de continuar a contribuir. Não é uma obrigação, é uma escolha. E como tal, exige políticas públicas que a tornem possível: modalidades de trabalho parcial, incentivos à contratação sénior, ambientes laborais adaptados, menos idadismo e mais reconhecimento do valor da experiência.
Mas não se trata apenas de continuar a trabalhar. Trata-se de continuar a participar. De sentir-se parte. De ter um lugar. E, nesse ponto, a aprendizagem contínua desempenha um papel decisivo.
Aprender para continuar vivos
A ideia de que a aprendizagem termina com a vida laboral já não se sustenta. Num estudo recente com pessoas com mais de 65 anos em Singapura, aquelas que se mantinham ativamente envolvidas em atividades formativas e mostravam uma atitude positiva em relação à aprendizagem contínua relataram maior bem-estar psicológico e melhor perceção da qualidade de vida.
Embora não se possa estabelecer uma relação causal direta, a mensagem é clara: aprender não é apenas adquirir conhecimentos, é continuar a sentir-se vivo.
A formação permanente na velhice não é um luxo: é uma ferramenta de dignidade. Não apenas para quem deseja continuar profissionalmente ativo, mas também para quem busca cultivar interesses, explorar novos caminhos, atualizar-se ou simplesmente manter-se conectado com o mundo. Oferecer oportunidades educativas acessíveis, flexíveis e culturalmente diversas às pessoas idosas é um investimento em saúde, inclusão e justiça intergeracional.
Voluntariado: contribuir, conectar, transformar
E se falamos de seguir pertencendo, o voluntariado merece um capítulo à parte. Dedicar tempo a atividades comunitárias, sociais ou culturais não beneficia apenas quem recebe esse apoio: transforma também quem o oferece.
Numerosos estudos demonstraram que o voluntariado regular — cerca de 100 horas por ano — está associado a menor mortalidade, melhor saúde funcional, maior bem-estar emocional e significativa redução da solidão e da depressão.
O voluntariado permite às pessoas idosas valorizar a sua experiência, o seu tempo e as suas capacidades. Oferece-lhes sentido, vínculos e propósito. E à sociedade, oferece um capital humano valioso que, por muito tempo, foi subutilizado.
Não apenas pensões: propósito, escolha, autonomia
Por isso, falar de longevidade não pode limitar-se a falar de pensões ou de dependência. Tem de ser, também, uma conversa sobre o direito de continuar a aprender, trabalhar, participar. Sobre como queremos viver esse tempo extra que a história nos concedeu. E sobre como a sociedade pode apoiar esse desejo de permanecer ativo sem exigir heroísmos nem negar o direito ao descanso.
A reforma não deveria marcar o início de uma contagem regressiva, mas o começo de uma etapa com tempo ganho. Tempo para fazer outras coisas, em outro ritmo, com outro sentido. Algumas pessoas continuarão ligadas ao trabalho remunerado, outras ao voluntariado, outras à formação, à arte, à política, ao cuidado.
O importante é que possam escolher. Que tenham condições para isso. Que a longevidade não se traduza em isolamento ou passividade, e sim em autonomia e decisão.
Quando a experiência continua a pulsar
Envelhecer não é apagar-se. É transformar-se. E cada vez que uma pessoa idosa encontra uma forma de continuar a contribuir, aprender ou participar, toda a sociedade se enriquece.
Porque a experiência não expira. Porque a vitalidade não tem idade, quando é cultivada com sentido, com oportunidades e com respeito.
Por que continuamos a falar da reforma como se a vida se apagasse aos 65?